sexta-feira, 19 de março de 2010

Expansão do ensino superior e qualidade (2)

2. Sobre a avaliação. A questão da avaliação do ensino superior está ligada aos objectivos e às estratégias que norteiam o funcionamento dos estabelecimentos deste nível. É uma matéria complexa que não cabe nestas linhas.
Antes de tecer quaisquer considerações sobre as matérias aqui arroladas, quero lembrar que neste espaço alimento utopias, e parece-me que a massificação do ensino superior seja um objectivo também utópico. Importa recordar que, todos os anos, as nossas crianças lutam por um lugar na escola. E a nossa escola ainda não têm lugar para todos. O objectivo de Jomtien (1990) está a ser uma miragem. O mesmo se pode dizer do direito à educação a que todos, mulheres e homens de todas as idades, no mundo inteiro têm direito. Não ignoro os nossos esforços por uma educação para todos. Muito temos feito, é verdade, mas também muito nos temos dispersado e confundido. A confusão deve absoluta a ponto de pensarmos que o nosso principal objectivo é o ensino superior. Não pode ser. Parece-me que andamos a brincar às universidades, quando no lugar de garantirmos um lugar para todos no ensino básico e secundário, queimamos etapas (corta-mato) em direcção às universidades e/ou instituições equiparadas.
E agora? As universidades já existem, mal criadas ou não, elas estão lá no terreno e a funcionar. Que passos devemos dar para as tornar mais operacionais, mais dinâmicas, mais competitivas? A avaliação será imprescindível? Eu julgo que ela já vem tarde. Refiro-me à avaliação institucional. Embora saiba que qualquer indicador de avaliação pode ser susceptível de discussão, é defensável que haja algum critério de abono, um instrumento fiável de medição da qualidade das nossas instituições. Então, temos que avançar no sentido de definirmos os indicadores. Temos referências? Tantas. Até podemos, como se diz em latim, “mutadis mutandis”, a partir das grandes referências que tivermos.
Como devemos todos saber (às vezes esquecemo-nos), a avaliação é um processo selectivo por excelência. Os resultados de uma avaliação indicam se algo vai bem ou mal. Não nos esqueçamos disso. Pode ser que estejamos a pedir algo que nos vai fazer “mal”. Os resultados devem ser usados para separar, manter ou promover. Isto deve estar claro. Se for para brincarmos às avaliações, é melhor ficarmos por aqui.
O passo que pretendemos dar, poderá indicar-nos que alguns cursos não são universitários, ou no pior cenário, que alguns estabelecimentos de ensino superior não são universidades. Também poderá indicar-nos (porque não?), que alguns cursos ou universidades são dos melhores que há neste planeta.
Temos que libertar as mentes para que as universidades surjam fortes e dinâmicas no mundo do conhecimento.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Expansão do ensino superior e qualidade (1)

Há dois dias, um colega enviou-me textos sobre o ensino superior e a avaliação da qualidade. Um artigo escrito por alguém que me parece dominar este tipo de questões. No essencial, a articulista censurava os que instituem indicadores de qualidade para a avaliação do ensino superior. O meu colega ao enviar-me o texto, fê-lo com o propósito de suscitar um debate. Eu que não sou especialista em avaliação, mas bastante intrometido no assunto, aliás, em assuntos de educação, fiquei por elaborar uma reflexão alargada à expansão do ensino superior. Porque sou politicamente incorrecto, tenho evitado que as minhas utopias agitem o político e interfiram nas decisões de governos. E quero continuar nesta linha, embora seja inevitável alguma irreverência...política. Vamos por partes:
1. sobre a expansão do ensino superior: quem pensou nisto? não sei. Mas posso imaginar que seja esta a vontade de muitos moçambicanos ávidos em estudar próximo dos locais de residência. Acho que a medida é por demais acertada. Irá evitar que continue a haver "deslocados" de escola, aqueles que abandonam as suas famílias e viajam à procura de uma escola, uma universidade em terras bem longíquas das suas e não voltam às suas origens. Há muitos deslocados de escola no meu país. Este grupo de indivíduos hoje olha para trás e tem um misto de saudade e revolta por nada poder fazer para mudar o curso de (sub)desenvolvimento dos seus bairros e cidades. São pessoas como eu, deslocadas: a escola deslocou-me da Munhava (Beira). Apesar de estar de acordo com o espírito que norteia a expansão do ensino superior, não posso deixar de criticar a forma e os procedimentos usados. A forma tem a ver com as infraestruturas (edificios e equipamento) e os procedimentos com o funcionamento (basicamente corpo docente, gestão de recursos e avaliação).
No que diz respeito às infraestruturas, tenho reparado que as unidades de expansão, ou melhor, expandidas, estão, na sua maioria, mal equipadas (deficiente ou enexistente serviço bibliotecário; deficiente ou inexistente laboratório; salas de aulas mal equipadas, etc.). Estas e outras anomalias condicionam os serviços universitários e a aceitação dos graduados no mercado do trabalho. Para agravar a situação dos potenciais utilizadores destas universidades, a selecção do corpo docente é feita, geralmente, com base no critério único de certificação, isto é, basta o candidato (?!) apresentar um certificado universitário para ser elegível. Parece já não contar a experiência, a média, a capacidade de trabalhar sob pressão, o ter feito uma pós-graduação, etc.. Paralelamente a tudo isto, parece-me que a gestão das universidades esteja a ser feita fora delas. Isto retira a autonomia e a criatividade que se pretende nas instituições do ensino superior. Falta às universidades, a verdadeira autonomia nas decisões que ela toma, se é que as toma.
Como dizia uma colega, até atingir o caos. Se não tivermos condições para sustentarmos as universidades é preferível andarmos devagar. Como diz o ditado "correr não é chegar". Eu quero universidade inclusive no meu bairro. Mas, tem de ser universidade! Este tempo é para nos afirmarmos em África e no mundo. A expansão do ensino superior tem de ser realizada com sucesso. Seguramente, se todos nós estivermos envolvidos neste esforço, digo, se o esforço de expansão não for de um grupo, mas de todos nós, há maior possibilidade de êxito. Todavia, tratando-se de universidade, o esforço não deve ser popular, mas científico. A tarefa da universidade é produzir conhecimento e servir a sociedade. Quando isto não acontece, a sociedade enfraquece, torna-se vulnerável e depende das outras nações.
É preciso não termos ilusões sobre a natureza de uma universidade. A sociedade moçambicana deve deixar de dar lições aos académicos e cientistas, porque actos políticos menos conseguidos podem banalizar a missão destes e demiti-los de suas responsabilidades sociais. A universidade não precisa de lições sobre o seu desenvolvimento. Ela afirma-se através da observação contínua dos fenómenos que a rodeiam e pela introspecção. Por isso, precisa de estabilidade.
Julgo que é chegado o momento de estabelecer uma moratória de pelo menos cinco anos para consolidar as instituições e avaliar os resultados. Haja coragem!